Essa figura feminina é a deusa grega Diké, filha de Zeus e de Thémis, que, de olhos abertos, segura

Essa figura feminina é a deusa grega Diké, filha de Zeus e de Thémis, que, de olhos abertos, segura
"A justiça tem numa das mãos a balança em que pesa o direito, e na outra a espada de que se serve para o defender. A espada sem a balança é a força brutal, a balança sem a espada é a impotência do direito" - Rudolf Von Ihering, jurista alemão na obra "Der Kampf ums Recht", conhecida como A Luta pelo Direito, Palestra realizada em Viena , em 1872.

terça-feira, 16 de março de 2010

A LEGITIMIDADE NAS AÇÕES COLETIVAS EM PROCESSO CIVIL

Por Juarez Gadelha (Oficial de Justiça Avaliador Federal do TRT 8ª Região e bacharel em Direito pela Faculdade Ideal de Belém-Pa, Especialista em Direito Processual Civil pelas Faculdades Integradas de Jacarepaguá do Rio de Janeiro-RJ)
As ações coletivas dão tratamento diferenciado a legitimidade de agir em face das ações individuais. É bom registrar que, pela própria natureza do direito coletivo, não se tratando de direito subjetivo, pertencente a um indivíduo determinado, a sua efetiva proteção não é possível dentro da concepção individualista do Direito Civil e do Direito Processual Civil tradicional que refletem o liberalismo do século XIX. Daí a necessidade de adaptação de alguns institutos como, por exemplo, a legitimidade e a coisa julgada. Quem pode realizar a defesa dos direitos transindividuais em juízo, representando a coletividade se não se pode falar em titularidade individual dos direitos essencialmente coletivos, pois indivisíveis por natureza? A doutrina responde esta pergunta designando o representante adequado como aquele que será legitimado e terá condições de substituir os interessados em juízo e deduzir a pretensão coletiva. Assim, não é preciso que todos os titulares de um direito difuso sejam citados individualmente, para comparecerem em juízo, nem que todos os membros do grupo sejam ouvidos, para que a decisão vincule todos os integrantes de determinada classe ou moradores de certa região interessados. A doutrina ensina que há dois sistemas de representação adequada: ope legis e ope iudicis. No primeiro sistema é a lei quem designa como legitimado aquele que terá representatividade adequada para representar a coletividade, enquanto no segundo sistema é o juiz da demanda que analisando o caso concreto, verificará se há representação adequada daquele que se apresenta como autor da demanda. Nos Estados Unidos da América, a legitimidade ativa ou passiva para a propositura da class action é de qualquer integrante da categoria, independentemente de autorização específica ou de consenso unânime da classe representada. O direito brasileiro, por sua vez, optou por especificar, em lei, aqueles legitimados à defesa dos interesses transindividuais. Assim, enquanto nas class actions norte-americanas a legitimidade é do individuo, para que ele exerça a representatividade adequada da coletividade, examinada pelo juiz em cada caso concreto, aqui o autor é um representante institucional, previsto em abstrato pelo legislador. A discussão ganhou fôlego com a ampliação do rol de legitimados da Lei da ação civil pública pelo Código de defesa do consumidor que, em seu art. 82, § 1º, admite a dispensa pelo juiz do requisito da pré-constituição quando “haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido”. O Brasil utiliza, em síntese, o sistema ope legis, pois é através do legislador, quando criou a Lei nº. 7.347/85 no seu art.5º e na Lei nº. 8.078/90 no seu art.82 que designou aqueles que detêm a legitimidade para demandarem ações coletivas em juízo como representantes adequados de uma coletividade. Entretanto, na prática forense, é comum ver-se juízes analisando a legitimidade dos representantes adequados que a lei prescreve e mitigando barreiras que impedem o acesso à justiça, demonstrando que o Brasil, na verdade pode utilizar ambos os sistemas. Na prática há a substituição processual do ‘verdadeiro legitimado’ de modo a tornar o acesso à justiça mais efetivo e simples, dando, a lei, a possibilidade dos ‘verdadeiros legitimados’ se beneficiarem da representação de terceiros em caso de procedência do pedido. A doutrina discute se tal representação poderia ser legitimação extraordinária ou substituição processual, mas tal discussão seria improdutiva. O importante é dar o acesso àqueles que não podem demandar por si mesmos (ou porque não queiram ou porque não possam), sendo indiferente tal diferenciação, conforme Baziloni (2004, p.74), in verbis: Quando a lei autoriza terceiros a postularem em nome alheio, trata-se de legitimação extraordinária ou substituição processual, consideradas sinônimas pela doutrina. Poderíamos até pensar em uma diferenciação, dizendo que ocorre a substituição processual quando apenas uma pessoa determinada pode ser substituto, ao passo que na legitimação extraordinária há concorrência entre os legitimados. A diferenciação, porém, não é significativa a produzir efeitos diversos na prática. Assim, o autor da ação coletiva demanda uma ação cujos interesses não são os seus, substituindo os legítimos interessados. Daí o que poderia acontecer se tal representante adequado não se esforçasse o suficiente para ganhar a demanda? Os interessados e quem seriam prejudicados. Por isso, o legislador impõe certa mitigação da coisa julgada material em caso de improcedência da ação coletiva, pois a desídia do representante adequado não pode cercear o direito dos interessados, ao ponto de fazer os indivíduos perderem seus direitos. A importância da adequada representação é bem ensinada por Leonel (2002, p.168) quando escreve, in verbis: A representação adequada é de crucial importância no exame da legitimação. Dela decorre a regularidade do processo coletivo e sua aptidão à produção dos resultados desejados, especialmente os efeitos da coisa julgada transcendentes dos limites subjetivos da relação jurídica processual, e os escopos da economia processual e da pacificação dos conflitos coletivos. A lei elenca o rol de legitimados a entrarem com as ações coletivas, sendo, por exemplo, à título de ação popular “qualquer cidadão” desde que obedecidos os requisitos legais, no mandado de segurança coletivo os partidos políticos com representação no Congresso Nacional, as organizações sindicais, as entidades de classe e associações civis, e na ação civil pública em regime de interação da Lei de Ação Civil Pública e do Código de Defesa do Consumidor e demais leis extravagante em matéria coletiva, no chamado microssistema processual coletivo, segundo Mazzili apud Lenza (2008, p.166), in verbis: a) Ministério Público; b) Defensoria Pública; c) União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios; d) Autarquia, Empresa pública, Fundação (pública e Privada) e Sociedade de Economia Mista; e) Associação Civil que, concomitantemente, esteja constituída há pelo menos um ano nos termos da lei civil e inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (art.5º da LACP, na redação dada pela Lei 11.448/2007; art.82 do CDC; art.3º da Lei 7.853/89 e art.210 do ECA); f) Entidades e órgãos da Administração Pública direta e indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor (art.82, IV, do CDC); g) Sindicatos (arts. 5º, LXX, b, e 8º, III, da CF/88) e h) comunidades indígenas (art.232 da CF/88). Trata-se do que a doutrina chama de legitimação concorrente e disjuntiva. Verifica-se logo que o Ministério Público encabeça o rol de legitimados a tutelar por força do art.129, III da CF/88 todo e qualquer direito ou interesse transindividual, difuso ou coletivo, mas não os direitos individuais, por serem disponíveis. Zavascki (2008, p.38) afirma que o Ministério Público, in verbis: [...] não está legitimado a defender em juízo, irrestritamente, todos e quaisquer direitos individuais homogêneos. Sua legitimidade para tutelar tais direitos, quando ocorre, se dá não por força do art.129, III, da Constituição (já que de direitos coletivos não se trata), e sim porque sua tutela, em forma coletiva, constitui, em determinadas situações, providência que interessa toda a sociedade, o que atrai a regra de legitimação do art.127 da Carta Constitucional. Verifica-se, então, que foi a lei, ou melhor, o próprio CDC que consagrou a forma de legitimação das ações coletivas, como bem ensina o professor Gidi (1995, p.37): O CDC, ao regular a legitimidade nas ações coletivas, seguiu de perto as diretrizes consolidadas em nosso direito positivo desde a LACP, instituindo amplo e heterogêneo rol de entidades, cuja legitimidade é concorrente, disjuntiva e exclusiva. Este estudo não aprofundará o estudo da legitimação por meio da adequada representação por não ser o foco central da pesquisa, bastando saber que a extensão dos efeitos subjetivos da coisa julgada coletiva são ampliados em relação a coisa julgada individual justamente pela forma de representação que dá legitimidade à terceiros para demandar em juízo direito alheio. Diz-se que a legitimação é concorrente porque a lei legitimou todas as entidades simultaneamente, a representar a coletividade em juízo, não se excluindo a legitimidade de uma delas, pelo exercício da legitimidade por outra, não sendo exclusiva dessa ou daquela entidade. Por disjuntiva a doutrina explica ser a possibilidade de a entidade legitimada propor a ação sozinha, não necessitando fazer litisconsórcio com as outras entidades legitimadas, que passa a ser uma faculdade de agir entre elas. Já a legitimidade exclusiva das ações coletivas se evidencia claramente no texto da lei, quando expressamente, designa os legitimados a estar em juízo representando a coletividade, conforme bem prescreve o art.5º da LACP e art.82 do CDC. Vê-se que o legitimado coletivo ou representante adequado, ou ainda, autor coletivo adequado, deverá ser capaz de transpor os óbices ao acesso à justiça, devendo estar habilitado a identificar os reais interesses do grupo em cujo nome atua, por mais dispersos e desorganizados que sejam seus integrantes e por mais fragmentados que estejam os direitos de que dispõem, é por tudo isso, que o legitimado coletivo deve estar revestido de características necessárias para atuar eficazmente em favor de direitos que ultrapassam a condição dos indivíduos isoladamente considerados, daí resultando a importância da representação adequada, a ser verificada in concreto pelo magistrado. Diante do que foi exposto, deve-se perceber logo que a legitimidade para agir no processo coletivo, concebida sob a perspectiva democrática, não deve partir da idéia de exclusão dos indivíduos abrangidos pela decisão, e sim, deve partir da idéia de inclusão daqueles indivíduos que partilham a mesma demanda, fazendo com que o processo seja um instrumento hábil e eficaz na contínua construção do Estado Democrático de Direito, onde se verifica a substituição do direito de serem ouvidos pessoalmente em juízo, pelo direito de serem adequadamente representados e ouvidos através do autor coletivo. Da análise da legislação em vigor, verifica-se com base na CF (art.129,III e se parágrafo), na LACP (art.5º), no CDC (art.82), bem como, na LOMPU (art.6º, VII), na LONMP (art.25,IV), na Lei n. 11.448/2007 (Defensoria Pública) e na Lei n. 8.906/94, art.54, XIV) as principais previsões dos legitimados ativos para ações coletivas (ações civis públicas). Do breve estudo da legitimidade para agir nas ações coletivas desenvolvido acima, pode-se destacar de forma clara que as pessoas físicas e as pessoas jurídicas não elencadas na LACP e no CDC não são legitimadas para demandar em juízo representando uma coletividade, seja ela uma comunidade, grupo, categoria ou classe, ou ainda, o conjunto de vítimas de fato danoso de origem comum.
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